01 | 02 | 2019

A inversão do ônus da prova em matéria ambiental

Artigo de autoria do sócio Pedro de Menezes Niebuhr e do advogado Felipe Neves Linhares trata sobre as implicações do enunciado do STJ que levanta dúvidas em demandas ambientais. Originalmente publicado no portal JOTA em 30/11/2018.

Com a recente edição da Súmula n. 618, o Superior Tribunal de Justiça contribuiu para gerar mais dúvidas e insegurança jurídica em demandas ambientais. O enunciado aprovado, que estatui que “a inversão do ônus da prova aplica-se às ações de degradação ambiental”, é deficiente em diversos aspectos.

A começar pela redação do enunciado. A Súmula n. 618 diz que a inversão do ônus da prova “aplica-se” às ações de degradação ambiental. A opção pela expressão “aplica-se” não esclarece se a inversão é uma possibilidade, atribuída ao juiz, ou se passa a ser a regra, de aplicação automática.

Se a intenção do Superior Tribunal de Justiça era reafirmar a possibilidade de o juiz aplicar a inversão do ônus da prova em demandas ambientais, a Súmula falou o óbvio. Essa possibilidade já estava prevista legalmente, por intermédio do inciso VIII do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor (1), aplicável às ações civis públicas ambientais por força do artigo 21 da Lei da Ação Civil Pública (2) . A Súmula, nesse aspecto, não resolve uma das principais controvérsias decorrentes desse cenário, que é a decretação da inversão do ônus da prova fundamentada no inciso VIII do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor sem que estejam delineados os requisitos previstos no mesmo dispositivo para tanto, notadamente a hipossuficiência da parte autora.

Noutro turno, se o Superior Tribunal de Justiça pretendia atribuir à expressão “aplica-se” um comando cogente, no sentido de que a inversão do ônus da prova passa a ser regra em demandas ambientais, o enunciado incorre em dois problemas. De plano, falou menos do que deveria, porque não deixou isso claro. Além do mais, com essa conotação o enunciado seria contrário a diversos precedentes, dentre os quais, alguns daqueles indicados pelo próprio Superior Tribunal de Justiça como ilustrativos da jurisprudência dominante que seria uniformizada por meio da Súmula. Nesses precedentes (por exemplo, no AgRg no AREsp 533.786/RJ, no AgInt no AREsp 846.996/RO, no AgRg no AREsp 183.202/SP, no REsp 883.656/RS e no REsp 1049822/RS) a inversão foi tratada como uma possibilidade; ela não se operou de forma automática, mas foi inclusive precedida da demonstração da já aludida hipossuficiência da parte autora (ainda que, equivocadamente, na nossa percepção, em uma acepção mais alargada), prevista como requisito para a decretação da medida no inciso VIII do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor.

Para evitar, portanto, malversação do §1º do artigo 926 do Código de Processo Civil (3), o enunciado da Súmula n. 618 deve ser lido como a uniformização do entendimento que admite a possibilidade de se aplicar a inversão do ônus da prova em lides ambientais, não sua obrigatoriedade.

O segundo problema, grave, na construção do enunciado, diz respeito à omissão, no texto da Súmula, da natureza das “ações de degradação ambiental” a que ele se refere; isto é, se às ações cíveis, criminais, ou se a lógica também seria aplicável às ações judiciais que discutem a validade de processos administrativos sancionatórios. Trata-se de omissão relevante, dada especialmente a pretensão de parte da doutrina e jurisprudência ambientalista em estender a lógica da inversão do ônus da prova para outros horizontes, afora o da responsabilidade civil.

Isso tem ocorrido com maior frequência, é verdade, no campo da responsabilidade administrativa. Em que pese a existência do posicionamento jurisprudencial, a nosso ver acertado, de que em processos administrativos ambientais o ônus da prova ainda seja da acusação (4), é possível mapear alguns precedentes em sentido contrário (5). Tais decisões invocam a presunção de legitimidade e veracidade da autuação administrativa para impor, ao acusado, a obrigação de comprovar sua inocência, interpretação que já tivemos a oportunidade de reputar como inadequada, sob diferentes aspectos (6) .

O receio, plausível, portanto, é que por força da redação lacunosa da Súmula n. 618, a lógica da inversão do ônus da prova seja aplicada, sem critérios, ao exercício do jus puniendi estatal. Nem se diga que esse risco é inexistente, pelo menos no que toca às demandas criminais. Alguns precedentes já caminham no sentido de imputar ao acusado o ônus de provar sua inocência em crimes ambientais. A título de exemplo, colhe-se:

“APELAÇÃO PENAL. CRIME AMBIENTAL. CABE AO RÉU O ÔNUS DA PROVA CONTRÁRIA À PRESUNÇÃO DE VERACIDADE DOS AUTOS DE INFRAÇÃO ADMINISTRATIVOS. […] A DEVASTAÇÃO AMBIENTAL COMETIDA NA FLORESTA AMAZÔNICA MERECE MAIOR GRAU DE REPROVAÇÃO NA FIXAÇÃO DA PENA” (7).

Diante da omissão do enunciado quanto à natureza das “ações de degradação ambiental” cabe ao intérprete, dessarte, consultar os precedentes indicados como representativos da jurisprudência dominante do Tribunal sobre o assunto. E o fato é que dos doze precedentes indicados como fundamento para a edição da Súmula, onze se referem às ações civis públicas ambientais. Apenas um deles, o REsp 1060753/SP, discutiu, como pano de fundo, a validade da execução fiscal de multa ambiental (tratava, pois, dos pressupostos para a responsabilização administrativa). No entanto, o entendimento firmado foi no sentido de reformar o julgamento do Tribunal de Justiça de São Paulo para permitir que o executado produzisse a prova pericial por ele requerida (e que havia sido indeferida nas instâncias ordinárias) que, teoricamente, corroboraria sua alegação de inocorrência de dano ambiental. A rigor, não se tratava de inversão do ônus da prova, mas do conteúdo do direito do acusado de comprovar sua alegação.

De tudo se conclui, então, que a despeito da omissão no enunciado, a orientação da Súmula n. 618 aplica-se, exclusivamente, às ações em que se discute a responsabilidade civil por degradação ambiental.

A propósito, a terminologia “degradação ambiental”, empregada na Súmula n. 618, tampouco representa conceito há muito sedimentado no âmbito da doutrina e jurisprudência, que prefere a expressão “dano ambiental”. Essa foi, inclusive, a opção do legislador ao prever, na Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, a responsabilidade objetiva ambiental, na esfera cível (8).

Uma terceira deficiência da Súmula n. 618 foi não ter especificado contra quem milita a inversão do ônus da prova. É comum que ações desse gênero sejam manejadas não só contra o agente direto da conduta alegadamente ilícita, mas também contra os entes federados e órgãos de proteção ambiental, seja lhes atribuindo corresponsabilidade por uma possível conduta omissiva na fiscalização das atividades poluentes, seja para lhes imputar o dever de recuperar o dano solidária e subsidiariamente (9).

O ponto é a possibilidade, aberta pela infeliz redação da Súmula n. 618, da inversão do ônus da prova alcançar todos os demandados indistintamente, imputando ao Poder Público a obrigação (e os efeitos dela decorrentes) de comprovar a licitude de conduta de terceiros, como única forma a afastar a própria responsabilidade estatal.
A fim de colmatar o problema gerado pela redação da Súmula n. 618, é indispensável que o ato de inversão do ônus da prova individualize as respectivas condutas para imputar, de forma expressa e específica a cada demandado, o ônus que lhe compete. Isso para não deslocar ao Poder Público o dever de produzir prova de regularidade da conduta de terceiro que seria, na maior parte das vezes, extremamente difícil de ser produzida.

Aliás, outro ponto sensível sobre o tema que a Súmula n. 618 não teve o cuidado de evitar diz respeito à impossibilidade de produção da prova, não pelo Poder Público, mas por parte do agente direto do ato alegadamente danoso. Se de um lado a inversão do ônus da prova “concretiza a facilitação do acesso à Justiça, da efetividade da prestação jurisdicional e do combate às desigualdades”, como defende o Ministro Herman Benjamin no REsp n. 883.656/RS (indicado como precedente para fundamentação da Súmula n. 618), a inversão não poderia redundar na imposição da produção de prova diabólica ou impossível ao réu (10).

1. A responsabilidade civil do Estado por omissão é subjetiva, mesmo em se tratando de responsabilidade por dano ao meio ambiente, uma vez que a ilicitude no comportamento omissivo é aferida sob a perspectiva de que deveria o Estado ter agido conforme estabelece a lei.
2. A União tem o dever de fiscalizar as atividades concernentes à extração mineral, de forma que elas sejam equalizadas à conservação ambiental. Essa obrigatoriedade foi alçada à categoria constitucional, encontrando-se inscrita no artigo 225, §§ 1º, 2º e 3º da Carta Magna.
3. Condenada a União a reparação de danos ambientais, é certo que a sociedade mediatamente estará arcando com os custos de tal reparação, como se fora autoindenização. Esse desiderato apresenta-se consentâneo com o princípio da equidade, uma vez que a atividade industrial responsável pela degradação ambiental – por gerar divisas para o país e contribuir com percentual significativo de geração de energia, como ocorre com a atividade extrativa mineral – a toda a sociedade beneficia.
(REsp 647.493/SC, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/05/2007, DJ 22/10/2007, p. 233).

A Súmula n. 618 também perdeu uma excelente oportunidade para definir, com clareza e a bem da segurança jurídica, o momento em que deve operar a inversão do ônus da prova. Infelizmente, existem precedentes em que os réus foram surpreendidos, em sentença, com condenações sob o argumento de que a eles competia a prova da regularidade de sua conduta, sem que esse ônus lhes tivesse sido atribuído oportunamente, antes da instrução (11). O assunto foi parcialmente equacionado no âmbito da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 422778/SP, que reputou que a decisão de inversão é regra de instrução (e não de julgamento), que deve ser proferida “preferencialmente na fase de saneamento do processo ou, pelo menos, assegurando-se à parte a quem não incumbia inicialmente o encargo, a reabertura de oportunidade” (12) . Não há, todavia, indicação similar no âmbito da Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, o que tornava oportuno e recomendável sua previsão na Súmula n. 618.

De toda forma, considerando que o posicionamento exarado nos autos Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 422778/SP traduz o melhor posicionamento sobre o tema, deduz-se que a inversão do ônus da prova, prevista na Súmula n. 618, deve dessa forma ser declarada antes do julgamento do processo, sob pena de nulidade.
Por fim, uma última, mas não menos importante, consideração. A Súmula n. 618 uniformizou entendimento da inversão do ônus estabelecido em diversos precedentes editados na vigência do antigo Código de Processo Civil (a rigor, nove dos doze precedentes são anteriores ao novo Código de Processo Civil) ou, pelo menos, fundamentados em interpretações doutrinárias e jurisprudenciais construídas à luz daquela legislação, atualmente revogada. Com o advento do novo Código de Processo Civil, a questão do ônus da prova ganhou tratamento substancialmente mais apropriado para esse tipo de demanda, consubstanciado na possibilidade da distribuição dinâmica do ônus da prova.
Ou seja, o Superior Tribunal de Justiça editou súmula para uniformizar entendimento construído sob os pressupostos da legislação velha, desconsiderando o novo regramento decorrente da possibilidade de distribuição dinâmica do ônus da prova previsto no atual Código de Processo Civil. Isso não passou despercebido pelas lentes do Prof. Édis Milaré, que denunciou o equívoco incorrido pelo Superior Tribunal de Justiça ao desconsiderar o novo regramento trazido pelo §1º do artigo 373 do atual Código de Processo Civil (13) .

A peculiaridade é que não se pode dizer que a Súmula n. 618 tenha traduzido o posicionamento dominante do Superior Tribunal de Justiça nesse aspecto, especialmente por ser impreciso dizer que essa é, ainda, a posição dominante do Tribunal sobre esse assunto. Julgados recentes do Superior Tribunal de Justiça, por exemplo, aplicaram a teoria da distribuição dinâmica do ônus probatório às demandas ambientais, em preferência à pura e simples inversão (14) . A rigor, a Súmula pode ter uniformizado um entendimento ultrapassado, construído à luz da legislação velha, negando tratamento mais adequado e atualizado ao tema.

Por essas razões, o enunciado da Súmula n. 618 deve ser revisitado ou reformado. Na pior das hipóteses, no cenário de sua manutenção, cumpre, portanto, considerar:

(i) que a inversão do ônus probatório não é automática, mas que sua aplicação é possível em demandas ambientais;
(ii) que, por se amparar na aplicação subsidiária ou analógica do inciso VIII do artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, os requisitos previstos nesse dispositivo – verossimilhança da alegação e hipossuficiência da parte – devem estar sobejamente caracterizados;
(iii) que a inversão do ônus probatório se restringe, exclusivamente, às hipóteses de responsabilidade civil decorrente de dano ambiental;
(iv) que a inversão do ônus probatório é regra de instrução e deve, portanto, ser decretada nessa fase processual, nunca em sentença;
(v) que a inversão do ônus da prova não pode resultar na imputação, ao réu, do dever de produzir prova impossível ou diabólica;
(vi) que o magistrado, antes de aplicar a excepcional solução da inversão do ônus da prova ao réu, deve avaliar a parte que está em melhores condições de produzi-la, para, preferencialmente, distribuir de forma dinâmica o ônus probatório.

Pedro de Menezes Niebuhr é professor dos Programas de Graduação e Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. Doutor em Direito Ambiental pela PUC/RS. Conselheiro do Conselho Estadual de Meio Ambiente de Santa Catarina. Advogado e sócio da Menezes Niebuhr Sociedade de Advogados.

Felipe Neves Linhares
Doutorando pela Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Direito Ambiental pela Universidade Federal de Santa Catarina. Procurador Municipal e advogado.


1) Art. 6º São direitos básicos do consumidor: […] VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;
2) Art. 21. Aplicam-se à defesa dos direitos e interesses difusos, coletivos e individuais, no que for cabível, os dispositivos do Título III da lei que instituiu o Código de Defesa do Consumidor.
3) Art. 926. Os tribunais devem uniformizar sua jurisprudência e mantê-la estável, íntegra e coerente.
§ 1º Na forma estabelecida e segundo os pressupostos fixados no regimento interno, os tribunais editarão enunciados de súmula correspondentes a sua jurisprudência dominante.
4) “[…] 8. Primeiramente, o ônus da prova da infração é do Estado (IBAMA), no exercício do jus puniendi.” (STJ, Decisão Monocrática no AREsp 192738, Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, 23/05/2018).
“DIREITO ADMINISTRATIVO. EXPLORAÇÃO DE MADEIRA EM TORA. PLANO DE MANEJO FLORESTAL SUSTENTÁVEL. AUTO DE INFRAÇÃO. DEVIDO PROCESSO LEGAL. GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. DESATENDIMENTO. AUSÊNCIA DE SUFICIENTE PROVA DO FATO. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA E RESPONSABILIDADE OBJETIVA. ANULAÇÃO DA PENA. SENTENÇA MANTIDA […] ônus da prova da infração é do Estado, no exercício do ius puniendi. A responsabilidade objetiva é pelo dano ambiental, para efeito de indenização civil, não alcançando a responsabilidade por infração administrativo-penal […]” (TRF-1 2005.36.00.014125-5, Relator: DESEMBARGADOR FEDERAL JOÃO BATISTA MOREIRA, Data de Julgamento: 01/11/2012, QUINTA TURMA).
5) “[…] 2. Os atos administrativos gozam de presunção de legitimidade, cabendo à parte adversa o ônus da prova para o fim de ilidir a aludida presunção. Precedente do STJ. […]” (TRF4, AC 5050038-40.2014.4.04.7000, TERCEIRA TURMA, Relatora VÂNIA HACK DE ALMEIDA, juntado aos autos em 27/02/2018).
“A prova emprestada do processo penal apenas trouxe dúvida quanto à ocorrência do ilícito e, pelos princípios que norteiam o processo penal, na dúvida, o réu é absolvido. Mas não é essa a lógica do processamento administrativo, no qual o ônus da prova é do infrator quanto à não ocorrência do ilícito e, na ausência desta prova ou na dúvida, prevalece a autuação administrativa devido à presunção de legitimidade que lhe é atribuída. […]” (TRF4, APELREEX 5005954-86.2012.4.04.7205, QUARTA TURMA, Relator CÂNDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 07/05/2015).
6) NIEBUHR, Pedro de Menezes. Processo administrativo ambiental: teoria, modalidades e aspectos controvertidos. 2. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2017. p. 263-271.
7) TJPA, Apelação Criminal n. 2014.03527198-03, 22.193, Rel. PATRICIA DE OLIVEIRA SÁ MOREIRA, Órgão Julgador 1ª TURMA RECURSAL PROVISÓRIA, Julgado em 2014-08-19.
8) Art. 14 […] § 1º – Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente da existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade. O Ministério Público da União e dos Estados terá legitimidade para propor ação de responsabilidade civil e criminal, por danos causados ao meio ambiente.
9) RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLUIÇÃO AMBIENTAL. EMPRESAS MINERADORAS. CARVÃO MINERAL. ESTADO DE SANTA CATARINA. REPARAÇÃO. RESPONSABILIDADE DO ESTADO POR OMISSÃO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA
10) Consoante asseverado pelo Ministro Arnaldo Esteves Lima “No entanto, o caso dos autos é típico da chamada prova diabólica, ou seja, a prova impossível ou excessivamente difícil de ser produzida, a qual coloca a parte em uma situação desigual, em desvantagem na produção da “credibilidade” da prova, uma vez que o fato ou documento posto em questão no processo é difícil ou impossível de se provar, por várias razões, que se diferencia no caso concreto. Não se pode exigir o impossível, o irrazoável na produção da prova crível” (STJ, AgRg no AREsp 109.972/DF, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 04/10/2012).
Aliás, o próprio Ministro Herman Benjamin já reconheceu, em casos similares, a inviabilidade de se exigir prova impossível no AgRg no RMS 46.636/GO: “ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ACOMPANHAMENTO DE CÔNJUGE DESLOCADO EM CONCURSO DE REMOÇÃO. INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO. PROVA DE EXISTÊNCIA DE VAGA. IMPOSSIBILIDADE.
[…] 2. Não se pode exigir da impetrante prova impossível, relativa à existência de vaga no local de destino da remoção, porquanto, além de tal exigência contrariar a jurisprudência desta Corte Superior, tal informação é restrita à própria Administração Pública. 3. Agravo Regimental não provido”. (AgRg no RMS 46.636/GO, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/03/2015, DJe 06/04/2015).
11) Nesse sentido, menciona-se ainda o HC 53.211/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 03/05/2007.
RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA. MOMENTO. SENTENÇA. POSSIBILIDADE. REGRA DE JULGAMENTO. OFENSA AO PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO. INEXISTÊNCIA.
1. A jurisprudência do STJ não se pacificou quanto à possibilidade de o juízo inverter o ônus da prova no momento de proferir a sentença numa ação que discuta relação de consumo.
2. O Processo Civil moderno enfatiza, como função primordial das normas de distribuição de ônus da prova, a sua atribuição de regular a atividade do juiz ao sentenciar o processo (ônus objetivo da prova). Por conduzirem a um julgamento por presunção, essas regras devem ser aplicadas apenas de maneira excepcional.
3. As partes, no Processo Civil, têm o dever de colaborar com a atividade judicial, evitando-se um julgamento por presunção. Os poderes instrutórios do juiz lhes autorizam se portar de maneira ativa para a solução da controvérsia. As provas não pertencem à parte que as produziu, mas ao processo a que se destinam.
4. O processo não pode consubstanciar um jogo mediante o qual seja possível às partes manejar as provas, de modo a conduzir o julgamento a um resultado favorável apartado da justiça substancial.
A ênfase no ônus subjetivo da prova implica privilegiar uma visão individualista, que não é compatível com a teoria moderna do processo civil.
5. Inexiste surpresa na inversão do ônus da prova apenas no julgamento da ação consumerista. Essa possibilidade está presente desde o ajuizamento da ação e nenhuma das partes pode alegar desconhecimento quanto à sua existência. […] (REsp 1125621/MG, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/08/2010, DJe 07/02/2011)
12) EREsp 422.778/SP, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, Rel. p/ Acórdão Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 29/02/2012, DJe 21/06/2012.
13) O ônus da prova nas lides ambientais e a súmula 618 do STJ. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI290505,31047- +onus+da+prova+nas+lides+ambientais+e+a+sumula+618+do+STJ . Acesso em: 14 nov. 2018.
14) AÇÃO INDENIZATÓRIA DE DANO AMBIENTAL. AFASTADA A APLICAÇÃO DO CDC. TEORIA DA CARGA DINÂMICA DO ÔNUS PROBATÓRIO. NÃO OBSTANTE A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA O AUTOR NÃO COMPROVOU O FATO CONSTITUTIVO DO SEU DIREITO (ART. 373, I, CPC/2015). DANOS MORAIS E MATERIAIS NÃO CONFIGURADOS. ALEGAÇÃO DE COMETIMENTO DE DANO AMBIENTAL PELA CHESF.
AUSÊNCIA DA ALEGADA VIOLAÇÃO DO ART. 1.022 DO CPC/2015. PRETENSÃO DE REEXAME FÁTICO-PROBATÓRIO. INCIDÊNCIA DO ENUNCIADO N. 7 DA SÚMULA DO STJ. (STJ, AgInt no AREsp 1.142.570/SE, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, DJe de 06/03/2018).

Por

Pedro de Menezes Niebuhr

Menezes Niebuhr Sociedade de Advogados


Professor dos Programas de Graduação e Pós-Graduação em Direito da UFSC, onde leciona, pesquisa e […]

Pedro de Menezes Niebuhr

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