02 | 05 | 2025

Penalidades Aduaneiras e Prescrição Intercorrente: O que define o Tema 1.293 do STJ – Parte 1

Em 12.03.2025, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou o Tema Repetitivo n. 1.293 (REsp 2.147.578/SP e REsp 2.147.583/SP), com impacto relevante no contencioso administrativo envolvendo infrações aduaneiras. O julgamento fixou três teses jurídicas fundamentais sobre a incidência da prescrição intercorrente no processo administrativo sancionador em matéria aduaneira.

Este é o primeiro de uma série de três artigos em que analisaremos os efeitos e os contornos práticos dessas teses. Nesse primeiro momento, trataremos das penalidades aduaneiras relacionadas ao controle do trânsito internacional de mercadorias. Na segunda parte, abordaremos as infrações voltadas à regularidade do serviço aduaneiro. Por fim, o terceiro artigo será dedicado às penalidades aduaneiras cuja natureza jurídica é objeto de controvérsia, especialmente quanto à aplicabilidade ou não da prescrição intercorrente.

As Teses Firmadas pelo STJ

O julgamento do Tema 1.293 resultou na fixação das seguintes teses jurídicas:

Tese 1: Incide a prescrição intercorrente prevista no art. 1º, § 1º, da Lei n. 9.873/1999 quando paralisado o processo administrativo de apuração de infrações aduaneiras de natureza não tributária por mais de três anos.

Tese 2: A natureza jurídica do crédito correspondente à sanção pela infração à legislação aduaneira é de direito administrativo, não tributário, se a norma infringida visa primordialmente o controle do trânsito internacional de mercadorias ou regularidade do serviço aduaneiro, ainda que reflexamente possa colaborar para a fiscalização do recolhimento dos tributos incidentes sobre a operação.

Tese 3: Não incidirá o art. 1º, § 1º, da Lei n. 9.873/1999 apenas se a obrigação descumprida, conquanto inserida em ambiente aduaneiro, destinava-se direta e imediatamente à arrecadação ou à fiscalização dos tributos incidentes sobre o negócio jurídico realizado.

Penalidades Relacionadas ao Controle do Trânsito Internacional de Mercadorias

De acordo com a segunda tese pelo Tema 1.293/STJ, a sanção aplicada por violação à norma aduaneira terá natureza administrativa, e não tributária, quando a infração se referir a regras cujo propósito principal seja o controle do trânsito internacional de mercadorias. Isso significa que a penalidade está voltada à fiscalização do fluxo físico de bens que cruzam as fronteiras nacionais — e não à arrecadação direta de tributos.

A distinção entre sanção tributária e sanção administrativa sancionatória está fundamentada no critério finalístico da norma infringida[1]. As penalidades aplicadas em razão do descumprimento de obrigações que visam assegurar a regularidade, segurança e rastreabilidade da circulação internacional de bens — como a exigência de documentos, a observância de trajetos e o cumprimento de formalidades logísticas — não guardam relação direta com o dever de pagar tributos, mas com a conformidade regulatória do comércio exterior. Nesse contexto, a natureza da infração é estritamente administrativa e o crédito decorrente da sanção tem caráter não tributário, pois a norma violada busca resguardar o interesse público no funcionamento ordenado do sistema aduaneiro, e não a arrecadação fiscal.

Entre as penalidades que se enquadram nessa categoria, destacam-se:

  • Multas por ingresso ou saída irregular de mercadorias do território nacional;
  • Multas pela condução, guarda ou transporte de bens sem a documentação aduaneira exigida;
  • Sanções pela introdução clandestina de mercadorias em zona primária ou secundária;
  • Infrações relacionadas ao descumprimento de regras de trânsito aduaneiro, como o transporte sob regime de trânsito aduaneiro comum sem observância das formalidades legais;
  • Sanções decorrentes da movimentação de cargas desacompanhadas dos documentos exigidos em portos, aeroportos e pontos de fronteira;
  • Multa por condução de mercadoria estrangeira desacompanhada de documentação legal exigida;
  • Multa por descumprimento do regime especial de trânsito aduaneiro, como o não encerramento de trânsito ou o desvio de rota;
  • Multa por não apresentação de bens transportados no recinto alfandegado de destino;
  • Multa por extravio ou violação de carga sob controle aduaneiro;
  • Multa por transbordo ou baldeação de mercadorias sem autorização da autoridade aduaneira;
  • Multa por desembarque de mercadorias em local não autorizado;
  • Multa por falta ou inobservância de lacres aduaneiros;
  • Multa por falta de comunicação de avarias ou alterações ocorridas durante o transporte internacional;
  • Multa por atraso na devolução de conhecimento de carga ou em outras obrigações acessórias relativas à logística de importação e exportação.

Conforme reconhecido pelo STJ, tais infrações não têm como finalidade direta a arrecadação de tributos, ainda que possam, reflexamente, contribuir para a fiscalização tributária. Assim, os processos administrativos que apuram esse tipo de infração, quando paralisados por mais de três anos, devem ser considerados prescritos, salvo se demonstrada a existência de causa suspensiva ou interruptiva da prescrição.

Conclusão

A decisão proferida pelo STJ no Tema 1.293 traz maior segurança jurídica ao estabelecer balizas objetivas que delimitam as penalidades aduaneiras que estão submetidas à prescrição intercorrente. Neste primeiro artigo, demonstrou-se que as sanções voltadas ao controle do trânsito internacional de mercadorias são, em regra, de natureza administrativa e, portanto, estão submetidas ao prazo prescricional intercorrente de três anos. Na segunda parte desta série, trataremos das infrações aduaneiras voltadas à regularidade do serviço aduaneiro e, posteriormente, na terceira parte, abordaremos as penalidades cuja natureza jurídica — administrativa ou tributária — pode ser menos evidente, o que afeta diretamente a aplicabilidade da pres


[1] Paulino, Maria Ângela Lopes. As sanções no direito tributário: princípios e espécies. 2012. 326 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

Por

Gabrielle Brüggemann Schadrack

Menezes Niebuhr Sociedade de Advogados


Mestre em Direito pela PUC/SP. Pós-graduada em Direito Aduaneiro e Comércio Exterior pela Universidade do […]

Gabrielle Brüggemann Schadrack - Menezes Niebuhr

Por

Mariana Heim de Castro

Menezes Niebuhr Sociedade de Advogados


Pós-graduanda em Direito Tributário pelo IBET – Instituto Brasileiro de Estudos Tributários. Graduada em Direito […]

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