10 | 11 | 2022

A nova súmula 655 do STJ e seus efeitos diante da controvérsia acerca da presunção de esforço comum no regime da separação obrigatória de bens

A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) aprovou esta semana, em 9 de novembro de 2022, uma nova súmula acerca da união estável, mais especificamente sobre aquela contraída pelos maiores de 70 anos, nos seguintes termos: “Súmula n. 655: Aplica-se a união estável contraída por septuagenário o regime da separação obrigatória de bens, comunicando-se os adquiridos na constância, quando comprovado o esforço comum.”

A nova súmula n. 655/STJ, é um resumo do entendimento recentemente consolidado pelos Tribunais sobre o tema. Assim, não há nenhuma inovação quanto à imposição do regime da separação obrigatória às uniões estáveis contraídas pelos maiores de 70 anos, assim como aos casamentos quando um dos nubentes for septuagenário.

Por outro lado, merece destaque a parte final da referida súmula, a qual ressalva que haverá comunicação, entre os companheiros, dos bens adquiridos na constância da união estável apenas mediante a comprovação do “esforço comum” na aquisição dos respectivos bens.

É sabido que na separação legal (ou obrigatória) de bens, prevista no art. 1.641, do Código Civil[1], cada um é titular do próprio patrimônio. Entretanto, a Súmula 377, editada pelo Supremo Tribunal Federal em 1964, dispõe que: “No regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento”. Em outras palavras, a Súmula 377/STF acabava impondo, de certa forma, o regime da comunhão parcial de bens ao regime da separação obrigatória.

Entretanto, em maio de 2018, o STJ ressignificou a Súmula 377/STF, a partir do julgamento dos Embargos de Divergência em RESP n. 1.623.858 – MG (2016/0231884-4), complementando a redação daquela súmula, ao firmar o entendimento de que “no regime de separação legal de bens, comunicam-se os adquiridos na constância do casamento, desde que comprovado o esforço comum para sua aquisição.” (Grifos nossos). Dessa forma, para que ocorra a meação dos bens, é necessária a comprovação do esforço comum de ambos os consortes na aquisição do respectivo patrimônio.

Todavia, em que pese a releitura feita pelo STJ da Súmula 377/STF, muitos Tribunais Estaduais e Cartórios Extrajudiciais continuam aplicando a presunção de esforço comum para aquisição dos bens adquiridos na constância do casamento ou união estável e, consequentemente, realizando a partilha destes.

Importante destacar, todavia, que os cônjuges/companheiros, desde 2021, já poderiam se valer de disposições em pacto antenupcial como um meio para afastar a aplicação deste entendimento, ante o reconhecimento, pelo STJ, da validade do pacto antenupcial de separação obrigatória de bens que afasta expressamente a incidência da Súmula 377/STF, inclusive em relação à união estável. Nesse sentido, a Quarta Turma assim decidiu:

[…] no casamento ou na união estável regidos pelo regime da separação obrigatória de bens, é possível que os nubentes/companheiros, em exercício da autonomia privada, estipulando o que melhor lhes aprouver em relação aos bens futuros, pactuem cláusula mais protetiva ao regime legal, com afastamento da Súmula 377 do STF, impedindo a comunhão dos aquestos.[2](Grifos nossos).

Outro ponto que merece atenção é o fato de a nova súmula ter sido aprovada pelo STJ ao mesmo tempo em que o STF analisa a (in)constitucionalidade da obrigatoriedade do regime da separação total aos maiores de 70 anos – sob a perspectiva de que tal imposição estaria em desacordo com os princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade – a partir de um recurso extraordinário com agravo (ARE 1309642), que teve repercussão geral reconhecida[3], porém cuja data para julgamento da controvérsia ainda não foi fixada.

Em vista disso, tem-se que os Tribunais Estaduais, o STJ e o próprio STF vêm tratando sobre a separação obrigatória de bens e seus efeitos sob diferentes interpretações. Entretanto, a despeito das discussões em torno da aplicabilidade da Súmula 377/STF, inegável que a súmula recém-aprovada pelo STJ veio para, de uma vez por todas, colocar fim na dúvida quanto à necessidade de prova do esforço comum para comunicação dos bens adquiridos na constância do relacionamento, uma vez que, apesar do entendimento firmado pela referida Corte Superior ser neste sentido, muitos ainda aplicavam, erroneamente, a Súmula 377 do Supremo Tribunal Federal (STF), conforme mencionado acima.

Resta agora aguardar o julgamento do STF quanto à (in)constitucionalidade da imposição do regime da separação obrigatória de bens aos maiores de 70 anos, a fim de resolver mais uma – e talvez a principal – controvérsia sobre o tema. Julgado o referido Recurso Extraordinário, saberemos se a criação da súmula n. 655/STJ, simultânea à repercussão geral reconhecida pelo STF, foi mera coincidência, ou se já estavam os Ministros do STJ prevendo o que seria decidido pelo Supremo.


[1] Art. 1.641. É obrigatório o regime da separação de bens no casamento:

I – das pessoas que o contraírem com inobservância das causas suspensivas da celebração do casamento;

II – da pessoa maior de 70 (setenta) anos;

III – de todos os que dependerem, para casar, de suprimento judicial.

[2]REsp 1.922.347-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, por unanimidade, julgado em 07/12/2021, Dje 01/02/2022.

[3] Tema 1236/STF.

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